19.9.06

Meu despertar!!!

Golpeia o despertador sem abrir os olhos
gesto costumeiro nas manhãs de hoje
ergue-se sôfrego
avista o faixo luminoso
é o sol querendo entrar
mais uma estréia
mais um dia...

retomo o relógio e vejo a correria
emborco o leite
mergulho na tina, quente ou fria
o "bom dia" sai a 160 por hora
enfraquecendo quanto mais corro

não deixei os dentes prá depois nem o beijo
os ritos de espreguiçar-se abreviam-se
o atraso resume a alvorada num frenezi infundado
segundos antes tudo era calmo...

meu despertar é um ataque cardíaco
tudo é barulhento dentro de mim
as paredes e os outros
vêem um desesperado puxando as calças
caindo do minho, adentrando a casa
ganhando a rua e a vida...

meu despertar é um ataque cardíaco...

Lampejos

Para a minha pequena:

No lampejo da minha busca
fito teus olhos
repousando nos meus
instala-se a plenitude
nos corpos
no ar
no olhar...

29.8.06

Desisti!!!

comecei a fazer o inventário
desisti por falta de papel
do que vivi e o mais recente
não tem lugar pro que sou assim
te visitei no sonho
entediante aurora sem teus cabelos curtinhos
bateu na minha porta
chorosa me fez chorar
desisti do inventário
haja papel
haja papel
haja papel prá tudo o que há de rolar...

23.8.06

Roteiro

Na ponta dos pés
seguro pela ponta dos dedos das mãos
nem notando a ingratidão e o esforço
que o corpo faz pelo desejo do coração

nem parece suor de tensão
docemente o pescoço viaja
onde os olhos não podem ir
o queixo pendurado e mesmo assim o sorriso é notável

a câimbra maltrata o músculo, que nem trinta
esticado ao máximo, como sendo a final do campeonato
o último lance e é pênalti
quem viaja, graciosa, não é a bola

é a vida real em câmera lenta
uma televisão à cores e a cheiro...
pairando no ar e os dedos escapam

nem por isso...
nem pela queda, pela contração do músculo
nem pela nódoa roxa e pelo queixo
que agora morde um dente ao outro
e pensa repetitivamente "merda", "merda"...

nem por um momento achei que não valesse nada disso
nem me toquei que o chão estava molhado
e nem por isso eu deixaria de me esticar
nem por nada eu perderia essas formas
de forma nenhuma...

acordando tu te banha
sai apressada, atravessando fora da faixa
olhos ligeiros no objetivo de chegar
passinhos curtos, joelhinhos...
rotina malvada que não te deixa piscar prá mim...

daqui faço um filme
onde somos protagonistas
o roteiro também é meu
no mais ordinário dos teus dias
eu estive lá...
não deixando um plano dessa cena curta
na mesma hora, todos esses dias...
encantando-se com o melhor do teu mais simples...

17.8.06

Pense...

A aurora anuncia-se
porém tímida, embebida no cinza
o galo anuncia a manhã
nada tímido...

o guerreiro
de campana até muito
desperta e retorna
o corpo pesa
abalroado à cama por meio d'alma

estive contigo
a batalha foi feia entre o querer e o poder

quero tanto que quando penso
me vêm as lembranças mais improváveis
ilusão do cavaleiro
que
ou cavalga a trote
ou empunha a espada e o escudo

estúpido amante
que ainda tenta erguer-se

se o tempo firmar eu fico, durmo e moro
caso a taipa não segure os trovões
avisa-me
deixa-me ir...

16.8.06

O rengo e o sentir

vinha ele rengueando
caiu novamente no último puxão
serrou os olhos e impôs as mãos
quando nele porias as tuas

me veio sem cerimônia nem roteiro
escrevera a mais doce das investidas
entreteve-me com o teu beijo
deixou-nos encantados

ainda tive a sentatez insipiente da esquiva
mas cairia novamente
e em lençóis cheirosos
macios, delicados...

tatame celeste
onde jazemos nossos corpos
vulneráveis procurando abrigo
contrariando o maldito medo
dispostos a sofrer do mal do rengo

só o letreiro viu
o que nem a cortina censuraria
nem por nada confesso
o que a gente sentiu...

2.8.06

Fruto doce

Lá vem tu
carrinho em punho, bilhete e procura...
cá estou eu
lustre espelhado, firmeza, doçura...

tu anda pelas vitrines em busca de tudo
te recebo cantando, tão feliz
como se uma providência tivesse sido tomada
me olha sorrindo e até me admira
me pega, apalpa, cheira e prova...

segura com essas mãos
cheirosas e macias
enxergo tu'alma
no brilho dos teus olhos
adormeço, relaxo
assim que teu sorriso
encarna ainda mais teus lábios

me larga no ar atentando outros lados
caio maduro, lascado, mas sóbrio de susto
caminha a outros, ofertas, pechinchas

maduros por fora
bichados por dentro
atraem no lustre
repelem no cheiro
repuxam a boca
deixam querendo

enche o cesto
e saindo acena
derramo meu sumo
me vejo em pedaços
provado por vários
felizes vêm vindo
e eu te esperando

quisera eu
estar na tua lista
na feira do amor
tivesse eu
a sorte de estar
melhor do que estou
agora sem casca
sem sumo e sem gosto

de segunda a segunda
no mesmo lugar
tu passa e te perde

pois vê se me leva
se não nem demora
mais me que talham
permitem meu gosto
me encantam e se encantam

cuida, se não te passa...
e me perde...
não ando na lista
mas anda apressada
e vem me buscar...

Colisão

aqui nos cinco graus que fazem
tento exteriorizar a bruma que vi
numa colisão frontal
quando me vinham idéias
na manhã gelada
um banho de limpeza
idéias brotando
estrada brumenta, brumosa, sei lá...
sei que fui

esperançoso pelo natural processo
reerguendo o espírito
reaproveitando o mobiliário velho

o casaco ainda com interrogações
na bolsa, no bolso lateral
incertezas...

métrica não é o fundamental agora
subo na sargeta, na partida

então a auto-estrada
um caminhão
uma colisão
carregado
sentimentos...

cinco graus...
meia hora de convicção
mais semanas...
ofegante de esperança
caído e partido...

25.7.06

Marinheiro sem mar

Sentado na proa
mareado
mesmo estando o barco
no porto atado
lembrando das lembranças

resgatando o que não existe
ainda não
mas o gosto do presente
deixa claro e não latente
o desejo do nosso amanhã

e mais um dia se apaga no horizonte
nenhum peixe
nem marujo contente

mesmo assim
não penso em mudar de profissão
o rumo é o mesmo
o de sempre
o que Deus quiser

17/07/2006
13h42

24.7.06

A hora

O sol sobrepõe a saudade à vida
hábil e serena vai passando...
assim vai semeando o dia e os outros...
as roupas perfumadas pela pele tenra...
chegou a hora de te ver
floresce...

07/07/2006
16h43

21.7.06

Dentro de mim próprio

Hoje me arrastei prá fora de mim
busquei me agarrar pelos calcanhares
chorei na dor da despedida
senti como se fosse o fim

adentro meu próprio eu
munido de mim mesmo
subindo pelos calcanhares
habitando minha própria morada

dedos nos dedos
olhos, sentidos, ouvidos
olhares, sentimentos, sussurros...

11/07/2006
15h50

20.7.06

A noite em que não deste sinal

ontem, numa linha rápida
senti a solidão do vento gelado
nem ele me dava conversa

então o sol despede-se
o cobertor e eu repousando no frio da madrugada
um ouvido atento ao infinito...
junto com os olhos e a imaginação
o outro atento à cabeceira da cama
na companhia da esperança e da solidão
parada na porta, esperando não pernoitar

mas com ela reparti minha cama
nem os dois travesseiros me convenciam
sequer a luz do poste projetada na parede
até ela veio me ver

repouso o corpo da tensão da espera vã
agora entendo a expressão "peguei no sono"
agarrei-me a ele como a última condução
antes eu almejava a casa quente
há pouco me vinha o teu retrato me esperando

um café ou simplesmente algo bem mais essencial
tu
nem um tampouco outro
a condução me leva à manhã numa viagem sem volta
me detive ao sono
rendi-me ao descanso
depois da reza tomei a carruagem
vim parar na aurora

depois do banho
de água e de ervas
eis-me aqui

relato a solidão que é ficar mais ou menos longe
sem sentir teu perfume
sem sentir que algo querias me dizer
sentindo-me um monolingüe
numa terra de sábios

mas já é amanhã
e se o sol levanta e não pragueja
não me é de direito fazer diferente

19/07/2006
9h18

Retalho

Retalho de papel
onde a caneta não descansa
debruçando o que sinto

mão ligeira e ofegante
correndo atrás do pensamento
e ambos sempre atrás
do coração que não é retalho

07/07/2006
10h27